Autora de “Formas de Pensar o Desenho: desenvolvimento do
grafismo infantil”, Edith Derdyk fala sobre o papel do professor.
Segue um trecho da entrevista que pode ser lida na íntegra
pelo site Arte na Escola.
O educador
precisa desenhar!
Desenho pode
ser entendido como manifestação que acontece
em qualquer
lugar: as conchas na praia, os riscos na lousa, as
canetinhas em
cima da mesa, as pegadas de um bicho, o vento
no mar –
alguém ou algo passou por ali humanizando e
ressignificando
os espaços. A vocação do desenho é transitiva,
estando
presente em muitas modalidades, matérias, espaços,
alcançando um
sentido maior e mais expansivo que escapa do
entendimento
do desenho apenas como ‘coisa de lápis e papel’,
segundo Mário
de Andrade. Edith Derdyk.
Como o
professor pode conseguir o equilíbrio entre mediar o ensino do desenho e
simplesmente "deixar desenhar"?
Acredito em parcerias entre educador e educando, entre
educação e arte, entre o sujeito e a matéria, entre experiência e conceito,
entre sensibilidade e inteligência, entre experimentar e adquirir informação,
tal como num jogo de peteca onde a graça é não deixá-la cair. Aí também entra
como ingrediente a sutil arte de educar, onde o educador não impõe e nem se
impõe, mas consegue proporcionar e ativar o que cada criança necessita para
realizar seu potencial
criativo. E para isto nada melhor do que o educador
que trabalha com arte, estar afinado com seu próprio instrumento de trabalho.
A excessiva
exposição das crianças à avalanche de imagens, que você caracteriza como tempos
da "ficção e da paródia", certamente influencia muito o desenho infantil.
Que sugestão você daria para o professor incentivar a criança a desenhar
"outras imagens"?
Investigar onde está o manancial de nosso imaginário,
seja individual, seja coletivo, seja da criança, seja do adulto, implica em não
perder de vista a perspectiva da experiência. Ainda mais em se tratando de uma
linguagem expressiva e criativa cuja construção acontece justamente onde reside
o sabor da experimentação. Também é muito importante perceber que o imaginário
(lembrando que imaginário nasce da palavra “imagem”) está totalmente conectado
com a observação - do aqui e do agora - e que o estado da observação do mundo
convoca também nossas memórias. Observação, memória e imaginação caminham
juntas, são as matérias do nosso corpo que vive nesta paisagem contemporânea.
Em um fórum
de discussão no site Arte na Escola sobre "A responsabilidade do ensino do
desenho, modelos e propostas na Educação Infantil”, professores relataram falas
de alunos como: "não sei desenhar" ou o "meu desenho ficou
feio". De que maneira o professor pode lidar com afirmações assim?
Formulações como estas têm suas origens numa idéia de desenho calcada em modelos clássicos
representacionais, onde o desenho se realiza como cópia duplicada das figuras
do mundo, mais do que a possibilidade da experimentação. Dependendo do
repertório prático e teórico - que o educador carrega em sua bagagem e pela
maneira que o educador formula suas propostas de aula, o desenho vai para um
lado ou para o outro: ou para o desenho como cópia do real a priori ou para o
desenho como ação e experiência sem o compromisso anterior com os modelos
clássicos representacionais. Esta é uma longa história que atinge as origens
das academias de ensino no Brasil, com a vinda da Missão Francesa, em 1816, que
rebate hoje nesta enunciação “não sei desenhar”, povoando a criança e o adulto
de uma enorme frustração.
Neste mesmo
fórum, muitos reclamaram do desenho infantil estereotipado. Como caracterizar
esses estereótipos? Seria apenas uma linha tênue entre copiar um desenho e
imitar um desenho?
A cópia tem origem num modelo anterior de desenho onde
a criança, o adolescente e mesmo o adulto desenham uma ideia de desenho
distante de si mesmos, desenham se submetendo a um ideal de desenho. Imitação
sinaliza outra direção: significa apropriação, mimesis, pantomina (mímica),
onde o sujeito que desenha, desenha de dentro, desenha com o corpo inteiro e
não isento de sua subjetividade. Para esta diferença sutil, porém avassaladora
entre cópia e imitação estar bem clara para o educador, ele precisa, antes de
mais nada, desenhar!
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